20 Fevereiro 2025

Fake News se combatem com a verdade.

A Associação Nacional dos Analistas em Tecnologia da Informação (ANATI) vem a público refutar as alegações do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), divulgadas ao portal Convergência Digital, acerca da reestruturação da carreira de Analista em Tecnologia da Informação (ATI). A nota ministerial, além de distorcer fatos, omite questões fundamentais que comprometem a compreensão do público sobre os reais impactos da reestruturação.

Ao apresentar informações incompletas e contraditórias, o MGI induz a uma percepção equivocada de que a carreira foi devidamente valorizada, quando, na realidade, as mudanças implementadas resultaram em perdas salariais, restrições de direitos e agravamento da baixa atratividade do cargo. A ANATI considera fundamental esclarecer os pontos que foram omitidos ou distorcidos na comunicação oficial, garantindo que a sociedade e os próprios servidores tenham uma visão clara e embasada sobre os desafios enfrentados pela categoria.

Negociações impostas e a ausência de aumento real

O que deveria ter sido um processo legítimo de negociação, em 2023, tornou-se uma imposição por parte do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI). A pasta apresentou apenas duas propostas à ANATI: a primeira foi prontamente rejeitada pela categoria, enquanto a segunda, classificada pelos próprios representantes ministeriais como um modelo de "pegar ou largar", restringiu-se a redistribuir os valores entre níveis e padrões, sem qualquer reajuste real nos patamares iniciais da carreira.

O governo alegou que não haveria espaço orçamentário para um ajuste mais justo nos anos subsequentes. No entanto, essa justificativa revelou-se improcedente, pois diversas outras carreiras obtiveram melhores acordos posteriormente, o que comprova que a limitação orçamentária não era um fator intransponível, mas sim uma escolha política do Ministério em não valorizar a carreira de ATI.

Cabe destacar que, desde o início das negociações, a ANATI protocolou um estudo técnico embasado em referências tanto do mercado privado quanto do setor público. O documento propunha uma remuneração inicial de R$ 16 mil e um patamar final de R$ 27 mil para os ATIs, valores mais condizentes com a complexidade e a relevância das atribuições do cargo. Entretanto, essa proposta sequer foi debatida pelo governo, evidenciando a falta de diálogo e de compromisso real com a valorização da carreira.

 

Desvalorização em números

Contrariamente à narrativa do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) de que a carreira de Analista em Tecnologia da Informação (ATI) foi valorizada, os números revelam uma realidade bem diferente.

Comparando os reajustes previstos, o nível inicial do Plano Geral de Cargos do Poder Executivo (PGPE) – plano no qual os ATIs eram originalmente inseridos – atingirá, em 2026, o valor de R$ 12.154,37, considerando os aumentos aplicados sobre a Gratificação Temporária do Sistema de Administração dos Recursos de Tecnologia da Informação (GSISP), percebida por todos os ATIs até 2023. Já a nova estrutura remuneratória da carreira "valorizada" pelo MGI fixará o salário inicial em R$ 11.150,80 – o que representa uma redução de 14% em relação à estrutura anterior, sem sequer considerar as perdas inflacionárias do período.

Nos níveis superiores, a desvalorização persiste. O profissional só notará um ganho financeiro marginal de 1,92% ao atingir o nível B2, com R$ 14.288,17, enquanto, sob o PGPE, receberia R$ 14.018,66. Para alcançar essa pequena diferença, no entanto, o servidor precisará de no mínimo seis anos de trabalho, sem garantia de que não enfrentará obstáculos adicionais para sua progressão.

O quadro comparativo a seguir evidencia, em números, a desvalorização inicial entre a estrutura remuneratória do cargo, anteriormente inserido no PGPE, e a nova estrutura da carreira criada.

 

Outro ponto omisso na comunicação do MGI é que, na prática, nenhum servidor atingiu o topo da carreira até o momento. Dos 414 ATIs ativos, apenas três encontram-se no nível mais alto atualmente possível, na classe C, padrão 5. Mesmo no melhor cenário, o primeiro servidor a atingir o patamar máximo da nova estrutura só alcançará esse nível em 2029, caso as progressões e promoções não sejam dificultadas pelo Ministério. Atualmente, o interstício mínimo para progressão é de 12 meses, podendo chegar a 18 meses.

Além disso, a afirmação do MGI de que o topo da carreira teve um aumento de 61% não condiz com a realidade. Quando se compara a nova estrutura remuneratória com a estrutura anterior (incluindo a GSISP) e os aumentos concedidos ao PGPE, o percentual real de reajuste para o topo da carreira é de apenas 27,51%.

  • Topo da carreira no PGPE com GSISP em 2026: R$ 16.949,64
  • Topo da carreira na nova estrutura remuneratória: R$ 21.613,10
  • Percentual real de aumento: 27,51% (e não os 61% divulgados pelo MGI)

Além da redução salarial, há um grave déficit de profissionais de TI no governo federal, conforme evidenciado pela ANATI ao Ministério em diversas ocasiões e, atualmente, na última reunião do Sistema de Administração dos Recursos de Tecnologia da Informação (SISP). Na ocasião, a Secretaria de Governo Digital (SGD) apresentou um estudo que expôs a falta de servidores na área de TI, especialmente quando comparada a outros países. Esse problema, somado à baixa atratividade da carreira e à saída contínua de servidores, compromete a transformação digital do país, a proteção dos dados dos cidadãos e a segurança cibernética das soluções TIC do governo.

Os números de vacâncias no cargo de ATI são um reflexo claro do fracasso da política de "retenção e valorização" adotada pelo MGI, demonstrando que, mesmo após a reestruturação da carreira, os servidores continuam deixando seus cargos em ritmo acelerado:

  • 2023 – 7 vacâncias (6 por posse em outro cargo e 1 exoneração a pedido);
  • 2024 – 14 vacâncias (10 por posse em outro cargo e 4 exonerações a pedido);
  • 2025 – 5 ATIs já estão matriculados no Curso de Formação para o cargo de Analista e Técnico de Planejamento e Orçamento, o que sinaliza novas saídas iminentes.

Esse cenário escancara aquilo que o MGI insiste em não admitir: o cargo de ATI continua desvalorizado, pouco atrativo e incapaz de reter talentos, mesmo após as mudanças promovidas. Enquanto a pasta insiste em afirmar que a reestruturação representou um avanço, os dados comprovam o oposto: servidores continuam abandonando a carreira e o déficit de profissionais só cresce, comprometendo a capacidade de inovação e modernização da administração pública.

 

Perda de remuneração líquida

A transformação da estrutura remuneratória dos Analistas em Tecnologia da Informação (ATIs) – que anteriormente combinava vencimento básico e as gratificações GDPGPE e GSISP – para um modelo de subsídio único trouxe impactos diretos na remuneração líquida dos servidores. Com essa mudança, boa parte dos ATIs passaram a ser obrigados a contribuir, de forma compulsória, sobre a parcela da GSISP para fins previdenciários, o que reduziu significativamente seus vencimentos líquidos em comparação à estrutura anterior.

Antes da reestruturação, os servidores podiam optar por não incluir a GSISP na base de cálculo previdenciário, evitando descontos adicionais que, à época, ultrapassavam 14%. No entanto, essa decisão não era uma escolha livre, mas sim uma necessidade imposta pela defasagem salarial da carreira.

Com a mudança imposta pelo MGI, essa opção foi eliminada, e os descontos passaram a incidir compulsoriamente sobre toda a remuneração, resultando em perdas financeiras imediatas para grande parte dos ATIs.

Essa diferença evidencia mais uma distorção nos números apresentados pelo Ministério, que tenta inflar a percepção de valorização da carreira, ignorando a remuneração anteriormente praticada e os ajustes concedidos a outras categorias. Na prática, os ATIs continuam em desvantagem salarial, sem perspectiva de uma valorização real que os torne competitivos no setor público e privado.

 

Injustiças e imposição de barreiras estruturais

O MGI tenta afirmar que “a efetivação da carreira reflete a relevância dos ATIs”, mas omite os diversos alertas enviados pela ANATI sobre o processo de reestruturação da carreira e a necessidade de valorização adequada do cargo e de seus integrantes.

Em vez de adotar medidas efetivas para promover a retenção de talentos, o Ministério impôs novas barreiras à carreira. Um exemplo claro dessa política restritiva foi a publicação da Portaria SGD/MGI nº 893, de 19/02/2024, que impede a prorrogação da Licença para Tratar de Interesse Particular (LIP) por mais de três anos – um direito garantido a diversas outras carreiras da administração pública federal, mas negado exclusivamente aos ATIs.

Essa restrição sem precedentes fere diretamente o princípio da isonomia, ao estabelecer um tratamento diferenciado e prejudicial apenas para os Analistas em Tecnologia da Informação. A negativa de prorrogação da LIP cria um cenário de insegurança e limita a mobilidade dos servidores, dificultando o equilíbrio entre a carreira pública e projetos pessoais, algo que outros servidores podem fazer sem restrições semelhantes.

Além de ser injustificável e discriminatória, a restrição à prorrogação da Licença para Tratar de Interesse Particular (LIP) imposta pelo MGI fere a isonomia entre servidores e desestimula a permanência e o retorno de profissionais qualificados ao serviço público.

Se a intenção fosse fortalecer a carreira, o foco deveria estar na melhoria das condições salariais e estruturais, e não na imposição de barreiras que restringem direitos. Ao contrário de outras carreiras, onde a prorrogação da LIP permite a circulação de talentos entre os setores público e privado, essa limitação específica para os ATIs afasta ainda mais a carreira do mercado competitivo de TI, dificultando a retenção e o retorno de servidores experientes, que poderiam contribuir com a transformação digital do governo.

 

Baixa atratividade e manipulação dos dados do Concurso Publico Nacional Unificado (CPNU)

A realidade do Concurso Publico Nacional Unificado (CPNU) evidencia, mais uma vez, o desinteresse pelo cargo de ATI. Foram necessárias três convocações para tentar preencher apenas 300 vagas, um cenário incomum em outros certames de TI, mas recorrente nos concursos para ATI do Ministério.

  • 2009: 345 vagas ofertadas, todas preenchidas.
  • 2013: 200 vagas, apenas 190 aprovados.
  • 2015: 300 vagas, apenas 228 aprovados.

Desde 2013, os concursos para ATI não conseguem preencher todas as vagas, refletindo a baixa atratividade da carreira. O Concurso Publico Nacional Unificado (CPNU) apenas reafirma esse cenário, enquanto o MGI segue ignorando o problema e insistindo em uma política de valorização que não se sustenta na realidade.

A situação se torna ainda mais crítica quando comparada a concursos recentes, cujas carreiras possuem remunerações iniciais significativamente mais atrativas, como:

  • TCE-RJ – Inicial de R$ 21 mil;
  • Banco Central, BNDES, IPEA e STN – Inicial de aproximadamente R$ 20,9 mil;
  • TRF-3 – Inicial de R$ 16,5 mil;
  • TRF-1, TSE, STJ e CNJ – Inicial de R$ 14,8 mil

Além disso, enquanto o MGI afirma que houve 158 mil inscritos no CPNU - Concurso Publico Nacional Unificado), os dados oficiais demonstram uma realidade completamente diferente: apenas 58.432 candidatos efetivamente se registraram no concurso para o cargo de ATI, dos quais somente 30.493 compareceram para a prova. Isso representa uma abstenção de quase 48%, colocando o cargo entre os menos disputados do certame, mais uma falsa narrativa criada.

Especificamente, o cargo de ATI foi a 8ª vaga menos concorrida entre as 175 oportunidades distribuídas nos blocos temáticos e o 3º cargo de menor concorrência em todo o Concurso Nacional Unificado (CNPU).. Esses números desmentem categoricamente a afirmação do Ministério de que o cargo de ATI foi "uma das carreiras mais disputadas" e reforçam a falta de atratividade da carreira, especialmente diante da remuneração pouco competitiva e das condições oferecidas pelo governo.

Esses dados podem ser verificados nas planilhas divulgadas pelo próprio MGI em seu site oficial: https://www.gov.br/gestao/pt-br/concursonacional/blocos-tematicos/veja-as-planilhas-da-relacao-candidato-vaga-por-cargos-apos-abstencao - Candidatos presentes - Bloco 2. 

 

Dificuldades no preenchimento das vagas do Concurso Publico Nacional Unificado (CPNU) e desestímulo geral

Além dos números, a dificuldade em preencher as 300 vagas para o cargo de ATI é evidente. Na primeira chamada, 95 candidatos desistiram impossibilitando o preenchimento total das vagas. A ANATI estima que aproximadamente 30% dos candidatos que manifestaram interesse no curso de formação desistirão no ato da matrícula ou ao longo do curso.

É importante destacar que esse alto índice de desistência é uma particularidade do cargo de ATI e não se repete em outros cargos do certame. Esse fator comprova, de forma irrefutável, a baixa atratividade da carreira e a dificuldade de retenção de talentos, desmentindo a narrativa do MGI de que a carreira foi devidamente valorizada.

 

Fragmentação da gestão de TI e corporativismo

Em vez de promover a valorização dos ATIs, responsáveis pela gestão estratégica dos recursos de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) do Governo Federal, o MGI optou por inserir outras carreiras, como Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental (EPPGGs) e Analistas Técnicos de Políticas Sociais (ATPS), dentro do bloco temático de TI no Concurso Publico Nacional Unificado (CPNU) .

Essa decisão fragmenta a governança de TI no setor público, criando sobreposição de atribuições e diluindo a responsabilidade técnica, o que prejudica a consolidação de uma carreira única e especializada para a área. Além disso, levanta sérias dúvidas sobre a intenção do governo, que parece optar por dispersar as competências relacionadas à gestão dos recursos de TI em diferentes carreiras ao invés de fortalecer os Analistas em Tecnologia da Informação, que já possuem experiência e atribuições bem definidas para essa função.

Diante desse cenário, a ANATI alerta que essa política do MGI não representa uma valorização real da TI pública, mas sim uma tentativa de desconfiguração da carreira de ATI, criando barreiras para sua evolução e desenvolvimento dentro da administração federal.

 

Local inadequado para o curso de formação do Concurso Publico Nacional Unificado (CPNU)  e falta de respostas do MGI

Os novos servidores terão que enfrentar três meses de curso de formação presencial, recebendo apenas 50% da remuneração integral. O curso será realizado na Academia Nacional de Polícia, um local afastado do centro de Brasília, sem opções de alojamento e com transporte público precário. Enquanto outras carreiras terão o curso de formação na Escola Nacional de Administração Pública (ENAP), localizada na Asa Sul – área de fácil acesso –, os ATIs foram enviados para um local distante e sem estrutura disponível apropriada. Essa decisão do MGI dificulta a participação, prejudica a adaptação dos novos servidores e demonstra o descaso ministerial com a carreira.

Além disso, o MGI não respondeu aos Ofícios 01 e 02/2025, enviados pela ANATI, que questionavam a escolha do local do curso de formação e solicitavam uma alternativa mais acessível e justa.

O Ministério também permaneceu em silêncio sobre o apoio à Emenda nº 311, apresentada pelo Deputado Federal Gutemberg Reis (MDB/RJ) na Medida Provisória nº 1286/2024, que propõe uma solução para os problemas estruturais do cargo de ATI.

Diante da falta de diálogo e das condições impostas aos novos servidores, fica evidente que a reestruturação da carreira não teve como objetivo real a valorização dos ATIs, mas sim o enfraquecimento da categoria.

 

Conclusão

Os fatos expostos demonstram, de maneira inequívoca, que a reestruturação da carreira de Analista em Tecnologia da Informação (ATI) promovida pelo MGI não representou uma valorização real da categoria, mas sim um retrocesso. A imposição de um modelo remuneratório inferior ao de outras carreiras, a perda de direitos, a baixa atratividade do cargo e a falta de transparência na condução do processo revelam uma estratégia que enfraquece a atuação dos ATIs dentro da Administração Pública Federal.

A evasão crescente de servidores, o alto índice de desistências no Concurso Publico Nacional Unificado (CPNU) e a fragmentação da gestão de TI evidenciam que o governo não apenas falhou em valorizar a carreira, mas também comprometeu a capacidade do Estado de atrair e reter profissionais qualificados para a transformação digital do país.

A ANATI seguirá firme na defesa dos Analistas em Tecnologia da Informação, exigindo do governo um tratamento justo, transparente e condizente com a relevância estratégica da área de TI para a administração pública. Continuaremos cobrando respostas sobre os questionamentos ainda não esclarecidos pelo MGI, lutando por um processo de negociação legítimo e por medidas que assegurem a valorização e a retenção de talentos na carreira.

Diante dos fatos expostos, reafirmamos nossa posição em defesa dos direitos dos Analistas em Tecnologia da Informação e da necessidade urgente de revisão da política adotada pelo governo para essa carreira. Seguiremos mobilizados para que os profissionais de TI do setor público tenham a valorização e o reconhecimento que merecem.

 

Diretoria Executiva

Associação Nacional dos Analistas em Tecnologia da Informação (ANATI)